O que você faria em dez anos se conseguisse passar por cima de regras e normas estabelecidas? Pois empresas de tabaco, entre 2013 e 2023, conseguiram aumentar a presença de novos produtos no mercado em 347%. Como fizeram isso? Com manobras judiciais que até hoje impedem que cigarros com sabor de menta, hortelã, baunilha, morango e muitos outros deixem de ser comercializados, como previsto na resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, assinada em 2012 e validada pelo Supremo Tribunal Federal em 2018.
De acordo com dados da Anvisa, neste período de dez anos, a indústria de tabaco fez 1.212 novos pedidos de registro de produtos com sabor. São 121 marcas de cigarros e 96 fumos para narguilé com aditivos que têm registro ativo na Anvisa.
A diretora-geral da ACT, Mônica Andreis, e a coordenadora do nosso projeto tabaco, Mariana Pinho, escreveram sobre o tema em artigo publicado na Veja Saúde.
Na opinião delas, a sociedade fica com o gosto amargo dessas manobras: crianças e jovens começaram a fumar, experimentam cigarros mentolados, com cravo, canela, frutas e outros sabores que mascaram o desconforto da fumaça tóxica, e aumentam a absorção da nicotina, a substância responsável pela dependência química. Ambos, nicotina e aditivos de aromas e sabores, estão também nos dispositivos eletrônicos para fumar e nos narguilés.
De acordo com o Vigitel/2019, cerca de 80% das pessoas que já usaram vaporizadores ou cigarros eletrônicos têm entre 18 e 34 anos. A Pesquisa Nacional de Saúde/2019 reforça os achados: o percentual de uso entre jovens de 15 e 24 anos (2,38%) é 40 vezes maior que entre aqueles com idade superior a 40 anos (0,06%). Já o Covitel/2023 mostra que 39% dos usuários de cigarros eletrônicos usam para socializar e um em cada cinco desconhecem que os produtos contêm nicotina. O índice de consumo diário no país ainda é baixo (0,6%), mas é preciso ampliar a conscientização e fiscalização para evitar uma elevação neste índice.
A população, entretanto, entende esses riscos: A ACT encomendou ao Instituto Datafolha, em julho de 2023, pesquisa que aponta que 70% dos entrevistados são a favor da proibição dos sabores e aromas como forma de evitar a iniciação entre jovens, e 79% concordam que a venda de dispositivos eletrônicos para fumar continue sendo proibida no Brasil.
Pesquisas também mostram que 11% dos adolescentes brasileiros com menos de 14 anos já experimentaram cigarros e de acordo com a Organização Mundial da Saúde, 90% dos fumantes começaram antes dos 19 anos. Tabagismo é uma doença pediátrica, mata mais de 160 mil brasileiros por ano e acarreta um custo anual de R$92 bilhões com despesas médicas e afastamento ou aposentadorias precoces por doenças associadas ao consumo e exposição ao tabaco.
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