A relação entre a economia e a promoção da saúde permeou os debates da 16ª edição do Seminário Alianças Estratégicas para Promoção da Saúde, realizado anualmente pela ACT Promoção da Saúde, em Brasília. Entre 21 e 24 de agosto, mais de 160 pessoas – entre representantes de organizações da sociedade civil, de pesquisa e do serviço público – estiveram no evento para trocar experiências e conhecimentos na área da saúde, especialmente na prevenção de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT’s). Foram mais de 40 apresentações, em 17 mesas, entre elas duas audiências públicas e um seminário no Congresso Nacional.
Com o tema “Saúde e desenvolvimento”, o diretor do Instituto Nacional do Câncer (INCA), Roberto Gil, inaugurou as palestras com destaque ao fato de que as DCNT’s são as principais causas de perda econômica por morte e incapacidade no mundo. Mas boa parte dos casos pode ser prevenida. “É possível ter interferências em todas as etapas do câncer, mas é na prevenção onde mais se economiza recursos públicos e gera bem-estar”, disse.
O oncologista fez uma avaliação dos investimentos em saúde e apontou inversões no financiamento da saúde no Brasil, onde o sistema suplementar acaba recebendo mais recursos públicos que o SUS. Para ele, a inclusão de mais impostos sobre produtos nocivos à saúde na reforma tributária, em discussão no Senado, pode mudar esse cenário.
O tema esteve em alta na mesa sobre as dinâmicas econômicas que impactam o acesso aos alimentos saudáveis, evidenciando ainda que, além de classe social, a fome tem cor e gênero. Ao lado disso, o debate sobre determinantes comerciais da saúde apontou sobre os jogos de interesses e os lucros por trás das escolhas e apresentou a publicação do periódico The Lancet que reconhece produtos e as práticas de alguns agentes comerciais estão tendo impactos cada vez mais negativos na saúde e na equidade humana e planetária.
Logo depois, foi lançado o relatório “Blackwashing: as corporações estão engajadas na pauta racial?” pela nutricionista da ACT, Vitória Moraes, que apontou como empresas de produtos nocivos à saúde têm se aproveitado na luta por justiça racial para parecer comprometidas enquanto, no fundo, só estão interessadas em vender.
Falando na relação entre tabaco e alimentação, as apresentações no evento deixaram evidentes as escolhas políticas que estão por trás da garantia de segurança alimentar e nutricional e a urgência de oferecer condições para que agricultores de tabaco possam plantar produtos que contribuam para a promoção da saúde e melhorar a própria vida.
No evento, a regulamentação dos Dispositivos Eletrônicos para Fumar e de tabaco aquecido – assim como os aditivos de sabor e de aroma – voltaram a ser discutidos por especialistas, que apresentaram os problemas que eles vêm causando à saúde dos jovens. Uma mesa comparativa apresentou as repercussões negativas da autorização da venda de DEFs em três países – Reino Unido, Japão e Nova Zelândia.
Outra pauta abordada no Seminário foi a iniciativa SAFER da OMS para controle do álcool, em mesa em que foram expostos os avanços e desafios na política regulatória no Brasil, sobretudo em relação à restrição de publicidade e propaganda, de disponibilidade e acesso e à tributação. “Essas são consideradas as três melhores medidas pela OMS frente aos obstáculos do consumo nocivo do álcool ao desenvolvimento”, explicou a coordenadora do Projeto Álcool da ACT, Laura Cury.
“Sem deixar ninguém para trás”
Coordenada pela coordenadora de mobilização de redes e coalizões da ACT, Denize Amorim, o painel “Equidade em saúde e desenvolvimento sustentável” provocou o público a pensar se as políticas públicas são realmente efetivas quando elas não alcançam os vários grupos sociais em suas especificidades.
“Como não deixar ninguém para trás em um sistema econômico criado para deixar grupos para trás?”, indagou a doutoranda em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz, Laurenice Pires – que se apresentou ao lado de Mahryan Sampaio (Perifa Sustentável) e de Raull Santiago (Perifa Connection).
Ocupação dos corredores do Congresso
Depois de uma pausa causada pela pandemia, o seminário retomou na programação as atividades de advocacy, fortalecendo a importância que a incidência política transparente por parte da sociedade civil tem para garantir participação mais plural nas tomadas de decisões. E o tema central, claro, foi a discussão sobre a Reforma Tributária Saudável. Os participantes do seminário se distribuíram em grupos para circular nos gabinetes dos senadores e apresentar a proposta dos tributos saudáveis.
Além disso, na semana do evento, a ACT participou no Lançamento da Frente Parlamentar Mista em Apoio aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, na Câmara dos Deputados, na terça-feira (22); e da Audiência Pública sobre Desenvolvimento Sustentável e Bem-Estar Social na Reforma Tributária, na Comissão de Direitos Humanos do Senado, na quarta-feira (23) – quando foi lançada d pesquisa Datafolha/ACT sobre tabaco, alimentação e álcool.
Para fechar, a programação também incluiu o Seminário sobre Poluição Plástica e Produtos nocivos à saúde: tabaco, ultraprocessados e álcool, também na Câmara dos Deputados, na quinta-feira (24), seguido da visita à exposição de fotografias ‘Uma pandemia plástica’, no Corredor do Anexo 1 da Câmara dos Deputados.