A fome tem raça, gênero e classe

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Recentemente, a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN) divulgou um recorte de dados sobre raça e gênero coletados a partir da pesquisa nacional do Inquérito de Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 (Vigisan).

Possivelmente você já conhece o dado mais alarmante da pesquisa, que mostrou que, em 2022, 33 milhões de pessoas estavam em situação de fome no Brasil, ou seja, insegurança alimentar grave. Isso representa 15,5% da população brasileira. Comparado à pesquisa anterior, realizada um ano antes, houve aumento de 14 milhões de pessoas em situação de fome, um dado estarrecedor e trágico, que pode ser compreendido como resultado da “continuidade do desmonte de políticas públicas, a piora na crise econômica, o aumento das desigualdades sociais e o segundo ano da pandemia da Covid-19”, de acordo com o estudo. Mais da metade (58,7%) da população brasileira estava em situação de insegurança alimentar, somando a insegurança alimentar leve, moderada e grave. 

Recentemente, foram divulgados dados refinados sobre o Vigisan, que mostram interseccionalidade e fome, ou seja, como a sobreposição de condições de raça, classe social e gênero vulnerabilizam mulheres negras pobres – e sobretudo quando cuidam de crianças menores de 10 anos.

  • A insegurança alimentar grave é mais frequente em domicílios chefiados por pessoas pretas (20,6%), quando comparado com pardos (17,0%) e brancos (10,6%).

  • Independentemente do nível de escolaridade, a segurança alimentar é mais frequente em lares chefiados por homens, e a insegurança alimentar moderada e grave é mais frequente nos lares chefiados por mulheres.
  • Entre pessoas desempregadas, a fome é mais frequente em lares chefiados por mulheres negras (39,5%), seguido dos lares chefiados por mulheres brancas (36,2%), homens negros (34,3%) e homens brancos (25,3%).

  • A segurança alimentar foi muito mais frequente nos lares com crianças menores de 10 anos quando os responsáveis eram brancos (46,2%) do que quando chefiados por pessoas pardas (29%) ou negras (23,1%). Sim: quase 77% dos lares chefiados por pessoas negras e com crianças estão em situação de insegurança alimentar.

  • Mesmo em lares chefiados por pessoas com maior escolaridade, ou seja, com oito ou mais anos de estudo, a raça e o gênero fazem diferença: a insegurança alimentar moderada ou grave estava presente em 33% dos domicílios chefiados por mulheres negras, em 21,3% dos lares chefiados por homens negros, em 17,8% dos lares chefiados por mulheres brancas, e 9,8% dos lares chefiados por homens brancos.

Pesquisas como essa são importantíssimas para conhecer como a fome está afetando a população brasileira, e como o Estado pode agir para mitigá-la – promovendo políticas públicas de distribuição de renda e acesso a alimentos saudáveis – in natura e minimamente processados, como preconiza o Guia Alimentar para População Brasileira. Nada de ultraprocessados e farinatas: enfrentar a fome com alimentos saudáveis e sustentáveis é a nossa bandeira.

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