Brasil: na vanguarda do retrocesso

vanguarda do retrocesso

Brasil: na vanguarda do retrocesso foi o título escolhido para apresentar a 6ª edição do Relatório Luz, documento que traça um panorama da implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 no Brasil, cobrindo as áreas sociais, econômicas e ambientais. O Relatório foi produzido pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 e contou com a colaboração de 51 organizações da sociedade civil, entre elas a ACT Promoção da Saúde.

O cenário revelado é alarmante: o país não avançou em mais de 80% das 168 metas analisadas e outras 14,3% tiveram apenas progressos insuficientes. Além disso, para 4,76% das metas não há dados disponíveis.

De acordo com os pesquisadores, os resultados apresentados nesta 6ª edição indicam um país em decadência, especialmente por conta da pandemia de Covid-19, da recessão econômica e de más decisões sobre as políticas públicas, fatores que aprofundaram as desigualdades e afastaram o país do desenvolvimento sustentável. A publicação também demonstra que há um desmonte de políticas, programas e orçamentos.

Os resultados da análise das metas foram os seguintes:

  • apenas uma (0,59%) das 168 metas analisadas teve progresso suficiente;
  • 24 (14,28%) tiveram progresso insuficiente;
  • onze metas (6,54%) permaneceram ou entraram em estagnação;
  • 110 (65,47%) estão em retrocesso;
  • ausência de informações relativas a oito metas (4,76%).

Recomendações

O Relatório Luz traz recomendações para que o Brasil volte ao caminho do desenvolvimento sustentável. Uma delas é a revogação da Emenda Constitucional 95, que estabelece limites para os investimentos públicos em áreas como saúde, educação e assistência social.

No caso do ODS 3, Saúde e Bem-estar, as recomendações incluem a implementação do Plano Nacional de Enfrentamento às DCNTs e da Política Nacional de Saúde Mental e o lançamento do Plano de Fortalecimento da Política Nacional de Controle do Tabaco, entre outras. O texto também propõe a adoção de mecanismos inovadores para financiar a saúde e a Agenda 2030 como um todo, incluindo a tributação de produtos não saudáveis (tabaco, álcool e alimentos ultraprocessados).

Já para o ODS 2, Fome Zero e Agricultura Sustentável, destacam-se a retomada do programa Bolsa Família, com valores adequados e a incorporação de pessoas em extrema pobreza e pobreza, a correção do valor per capita da alimentação escolar no orçamento público, garantindo montante suficiente a ser repassado a estados e municípios, e os programas de Aquisição de Alimentos e de Cisternas, com orçamentos nos níveis, em termos reais, equivalentes aos de 2012 e 2014, respectivamente.

No fechamento da edição, o GT se deparou com um novo aumento nos agravos à democracia e ações criminosas, especialmente na Amazônia, que culminaram no assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips. Por isso, os autores decidiram dedicar o documento a eles – uma homenagem que mostra que nós, organizações envolvidas com a Agenda 2030, vamos insistir no país e no trabalho árduo de promover o desenvolvimento sustentável sem deixar ninguém para trás.

Estudo de caso

Neste ano, a ACT foi convidada a elaborar o Estudo de Caso que fecha o Relatório Luz com uma discussão a respeito da participação de indústrias que fabricam produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente na implementação da Agenda 2030. Muitas delas costumam fazer propaganda de seus compromissos e iniciativas voluntárias de ESG (da sigla em inglês para Environmental, Social and Governance, ou, em português, “ambiental, social e governança”), mas análises mostram que esse tipo de ação traz poucos resultados. 

No Estudo de Caso, são dados exemplos de atividades das indústrias de bebidas açucaradas e de cigarros que pouco ou nada contribuíram para mitigar os danos causados por seus negócios, mas que recebem bastante atenção da mídia. Ao mesmo tempo, as mesmas empresas fazem lobby contra políticas realmente eficazes para diminuir o consumo e a carga causada por seus produtos, como o aumento da tributação. 

A conclusão é que esse tipo de iniciativa voluntária não é suficiente para ajudar na implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e reverter os retrocessos registrados. Medidas regulatórias e com base em evidências científicas são a forma mais eficaz de reduzir os prejuízos causados pelo consumo de produtos nocivos e, no caso da tributação, assegurar mais recursos para o financiamento de ações voltadas para a saúde e a sustentabilidade.

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Com versões disponíveis em português e inglês, o relatório também será lançado em evento paralelo ao Fórum Político de Alto Nível, instância das Nações Unidas que faz monitoramento da implementação da Agenda 2030, no próximo dia 6, em Nova York.

Anna Monteiro e Juliana Waetge

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